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Flores Para Algernon: Bruto e Inesquecível [Resenha] 

Hoje vamos fazer uma resenha de Flores Para Algernon – um livro marcante que catapultou a carreira de Daniel Keyes e foi ganhador do prêmio Nebula. Desde seu lançamento, em 1966, a obra já vendeu 5 milhões de exemplares e emocionou muita gente em todas as partes do mundo. 

Keyes teve a inspiração para essa história na época em que escrevia roteiros de quadrinhos para Stan Lee, mas quis desenvolvê-la um pouco mais, transformando-a, primeiramente, em conto. A história foi publicada inicialmente na edição de abril de 1959 da The Magazine of Fantasy & Science Fiction, quando acabou por ganhar o prêmio Hugo e, posteriormente, foi expandida para romance. 

A decisão final para a criação da obra se deu quando Keyes era professor de inglês para uma turma de jovens com baixo Q.I. e foi abordado por um dos seus estudantes lhe perguntando se seria possível se tornar inteligente caso ele se esforçasse bastante. 

Perturbador e profundo, Flores para Algernon é uma obra ainda contemporânea e é adotada como leitura obrigatória em diversas escolas americanas. Ao longo do tempo acabou gerando adaptações que vão desde o filme Os Dois Mundos de Charly (1968) que ganhou o Oscar até uma peça musical na Broadway. 

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A Procura Por Uma Cobaia

Começamos nossa resenha de Flores Para Algernon explicando que esse é um livro narrado em primeira pessoa como uma espécie de diário no qual Charlie Gordon, o protagonista da trama, descreve seu dia a dia e suas transformações ao realizar uma cirurgia inovadora destinada a aumentar a capacidade cognitiva de um homem com sérias limitações intelectuais. 

Portanto, a obra surge por meio das palavras de um homem de 32 anos e 68 de QI. É perceptível no início do livro que seus textos são acompanhados de excessos de erros e dotados de uma imensa inocência – indiferente às perturbações dos colegas de trabalho, ao fato de estar abandonado no mundo mesmo sem perceber e às suas imensas tragédias familiares. 

Após a realização da cirurgia, a própria escrita do diário vai se transformando aos poucos e o leitor começa a perceber, sem precisar ser avisado, que o QI de Charlie está aumentando. 

Charlie é o escolhido para o procedimento por diversos motivos, sendo o principal deles a sua incrível vontade demonstrada a todo mundo de querer se esforçar para ser inteligente, e da sua conexão com a professora Alice Kinnian, responsável pelos ensinamentos de uma turma de adultos com baixo Q.I. 

O Que Charlie Gordon Tinha?

O personagem Charlie Gordon tinha uma condição chamada Fenilcetonúria. Segundo descrito no próprio livro, não era sabida exatamente a causa dessa condição “da qual Charlie sofria desde criança: algum tipo de ocorrência bioquímica ou genética, possivelmente radiação ionizante, radiação natural ou até um ataque de vírus ao feto; quer que seja resultou em um gene defeituoso que produz uma, digamos assim, enzima dissidente que cria reações bioquímicas defeituosas. E é claro, aminoácidos recentemente produzidos competem com enzimas normais, causando dano neurológico.”

A Conexão de Charlie com Alice Kinnian

Alice Kinnian ensina habilidades de alfabetização para adultos com deficiência intelectual porque ela se preocupa e gosta de trabalhar com seus alunos. Ela não acredita que suas condições especiais os tornem seres humanos inferiores. 

É ela quem recomenda Charlie para o experimento dos professores Nemur e Strauss porque admira o desejo de Charlie de aprender. Charlie aprecia a preocupação de Alice com seu bem-estar. É possível perceber esse afeto, já que ela é uma presença constante em seus primeiros relatórios de progresso, embora não seja membro da equipe científica que o está examinando.

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Conhecendo Algernon

A tomada de decisão dos professores Nemur e Strauss de realizar testes em humanos é tomada após realizarem vários testes com ratos e um deles, Algernon, ter demonstrado que as mudanças poderiam ser permanentes nos roedores de laboratório. 

Algernon tinha se tornado um rato muito inteligente e, no momento da cirurgia de Gordon, era capaz de achar a solução por diversos labirintos quando estimulado. 

Uma das tarefas de Gordon após o experimento era derrotar o rato nos labirintos (eles ficavam em ambientes diferentes, mas a solução do labirinto era a mesma). Ao acompanhar os relatórios de Charlie, vemos que, durante vários dias, nosso protagonista não era capaz de derrotar o rato, muitas vezes nem sendo capaz de encontrar a saída para o labirinto. 

Inicialmente, isso faz despertar nele um sentimento de raiva em relação a um rato, afinal, como poderia ser um rato mais inteligente que ele? Mas isso rapidamente muda, com o aumento de Q.I. de Charlie Gordon que passa a achar o caminho cada vez mais rápido.

A partir de certo ponto da trama, Charlie começa a se identificar com Algernon, e vice-versa, primeiramente por observar no rato o seu futuro (já que tudo que acontecia com o roedor em termos de comportamento e evolução de Q.I era um indicativo do que poderia acontecer com ele), assim como via o rato como a si mesmo – apenas uma cobaia de laboratório aos olhos do mundo. 

Os Amigos de Charlie

Desde o começo dos relatório de progresso, vemos Charlie mencionando que trabalhava na área de limpeza da padaria Donner, um trabalho que um tio conseguira para ele num negócio de um amigo que prometera para sempre cuidar dele. 

Lá, mencionado, ele teria vários amigos, entre eles Joe Carp, Frank Reilly, Ernie, o gerente Gimpy e o sr. Donner. Charlie os tem como amigos porque eles estão sempre rindo, especialmente Joe e Frank – e na visão dele, quando alguém estava rindo é porque apreciava a sua companhia. Ele também acha engraçado quando falam que fulano “deu uma de Charlie Gordon”, quando alguém fazia besteira. 

Aos poucos, no entanto, o protagonista percebe que as pessoas na verdade, estavam tirando sarro dele e não sendo suas amigas. “Acho que é uma coisa boa descobrir como todo mundo ri de mim. Pensei muito sobre isso. É porque sou tão estúpido que nem sei quando estou fazendo algo estúpido. As pessoas acham engraçado quando alguém estúpido não consegue fazer as coisas do mesmo jeito que elas”, conclui. 

Isso também desperta sentimentos de tristeza e revolta, quando Charlie começa a tomar consciência de diversas situações similares da sua infância. 

Charlie, que até então demonstrava ser uma pessoa extremamente doce e sociável em seus diários, começa a cultivar esses sentimentos duros dentro de si. 

Ascensão e Queda na Padaria

O aumento rápido do seu Q.I. começa a espantar as pessoas da padaria, alguns por vergonha do que haviam feito com ele, alguns por inveja já que agora ele havia criado vários processos inovadores que o haviam premitido crescer na hierarquia da padaria e outros por questões religiosas – que acreditavam que nosso protagonista havia feito um pacto com o diabo para ficar inteligente. Até esse momento, a cirurgia não podia ser comunicada a ninguém – era segredo. 

Tudo descamba, finalmente, quando Charlie descobre um esquema liderado por Gimpy para roubar o Sr. Donner. Gimpy utilizava a inocência de Charlie para desviar recursos da padaria, o que causou revolta no nosso protagonista. Quando confronta Gimpy, achando que essa era a coisa certa a se fazer, Charlie, na verdade, remove a última ligação que justificava, para aqueles trabalhadores, a sua presença naquele local. Revoltados, pedem a sua cabeça ao Sr. Donner, que atende aos pedidos e demite Charlie. 

A Família Desaparecida

Continuando nossa resenha de Flores Para Algernon, chegamos ao ponto em que Charlie não trabalha mais na padaria. A parte boa é que ele não precisava mais se preocupar com dinheiro, já que a participação no projeto lhe proporcionava um bom salário. 

As situações passadas na padaria, o assédio moral que sofrera e a própria tomada de consciência que se dava paulatinamente na cabeça de Gordon sobre os problemas enfrentados por ele na vida vão lhe transformando cada vez mais num ser amargurado (o que é compreensível). 

Entre as memórias que vão se avivando, torna-se evidente os complexos mentais causados pela mãe, abusiva, que negava-se a reconhecer a condição do próprio filho. Rose Gordon tentava disciplinar Charlie com pancadas e gritos, enquanto seu pai Matt parecia entender mais sobre o filho, mas agindo com certa condescendência. 

Tudo muda quando nasce a irmã mais nova de Charlie que passa a rejeitá-lo, por vergonha dos amigos da escola. A própria mãe fica em pânico quando observa Charlie entrando na puberdade e obriga o pai a mandá-lo embora. Matt, então, o deixa com seu irmão Herman Gordon, o tio que irá cuidar de Charlie até falecer, logo após o protagonista iniciar a sua vida adulta. 

resenha de Flores Para Algernon

O Relacionamento Com Alice Kinnian

Começamos a perceber que Charlie inicia a sua atração por mulheres quando ela passa a não se referir mais à sua professora como sra. Kinnian, mas sim como Alice. 

Essa será a grande paixão da vida de Charlie, porém todas as vezes em que ele se aproxima para tentar uma relação mais íntima ele é acometido por forte dores de cabeça, ansiedade ou algum tipo de mal-estar que o impede de se aproximar, remetendo a reflexos e traumas em seu subconsciente da época em que ele tinha baixa capacidade cognitiva e era punido por sua mãe sempre que demonstrava qualquer interesse por meninas. 

Assim, apesar de haver um sentimento de amor entre os dois personagens, o relacionamento com Alice fica totalmente inviável com os constantes ataques do inconsciente de Charlie contra a relação. 

O Amadurecimento Intelectual, Mas Não Emocional

Há uma presença muito importante na obra que ainda não citamos aqui na nossa resenha de Flores Para Algernon – o psiquiatra Burt, destinado pela equipe pesquisadora para acompanhar a evolução emocional do nosso protagonista. 

É para ele que Charlie Gordon conta seus mais profundos segredos, inclusive da sua relação com Alice, ou seja, é um grande confidente. 

Em determinado momento, Burt tenta demonstrar para Gordon, já muito inquieto e traumatizado pelas lembranças que não param de chegar à sua mente, que, embora seu desenvolvimento intelectual tenha aumentado vertiginosamente em questão de meses, o amadurecimento emocional poderia levar muito mais tempo. 

De qualquer forma, aquele Charlie Gordon doce e sensível de antes do experimento já não existia mais. Agora toma corpo um Charlie Gordon autocentrado, cínico, niilista e que se entedia facilmente nas conversas com qualquer um – já que seu Q.I. se desenvolvera a tal ponto que ninguém mais conseguia surpreendê-lo com algo que ele já não soubesse. 

O Desejo de Não Ser Mais Cobaia

Próximo a uma conferência em que os doutores Strauss e Nemur iriam apresentar o seu experimento para toda a comunidade científica como um verdadeiro sucesso, Charlie começa a perceber em Algernon uma certa remissão intelectual. 

O rato está com um comportamento cada vez mais errático, não coopera mais como antes e demonstra-se irritado por diversos momentos. 

A princípio, Gordon relaciona isso com o que ele mesmo sente: a vontade de parar de ser percebido como uma cobaia, como uma invenção para ser explorada e mostrada por aí. Mas, quando os dois doutores estão apresentando os resultados de Algeron para a comunidade científica, Charlie percebe um erro de cálculo nas fórmulas dele e, ao refazê-las mentalmente, percebe que o rato entraria em declínio. 

Tomado por uma fúria incontrolável, Charlie rapta o rato, volta para Nova York, para de frequentar o laboratório e fica incomunicável. Ele sabe que o fim está próximo.  

Preparando-se Para o Fim

Observar o rato é, para Gordon, como observar o seu futuro. Eles são dois seres únicos ligados pela experiência. 

É possível ver nos relatório de progresso ele relacionando as diversas fases por que passa o rato com as que ele próprio irá passar no futuro. Aqui é bem interessante que uma das coisas que não é relacionado pelo narrador é o seu próprio comportamento que fica cada vez mais errático, agressivo e solitário com o comportamento de Algernon – como se fosse algo que o autor quisesse que o leitura percebesse sozinho. 

Já em seu novo apartamento alugado, Charlie decide que seria hora de se reconectar com a sua família e descobre que seus pais haviam se separado. Vou deixar de fora da resenha de Flores de Algernon essa parte, já que há uma profundidade nesses encontros que são, inclusive, bem importantes para a compreensão completa da obra (e não quero estragar essa parte da leitura).  

Nesse ínterim, Charlie também constrói um grande labirinto em um dos quartos especialmente para que Algernon pudesse se exercitar física e mentalmente e os laços desses dois personagens unem-se cada vez mais. 

Adicionalmente, Charlie começa uma relação com uma vizinha chamada Fay, uma espécie de artista espevitada que mexe com o protagonista principalmente na maneira de ver a vida sem preocupações. Quando está com ela, o peso do passado não recai sob o seu ombro, portanto, o ajuda a ser mais leve. 

O Que Significa Flores Para Algernon?

Entender o título Flores Para Algernon é um ponto central para a compreensão da obra. Ele se refere ao fato de que quando alguém morre, deixamos flores em seu túmulo para homenageá-lo. Assim, para um leitor atento, é possível perceber já no início da obra que Algernon, o rato, está fadado a morrer e, portanto, o mesmo deve acontecer com Charlie Gordon. 

Esse fato também pode ser percebido por volta da metade do livro quando o rato começa a apresentar os sinais de remissão e quando Charlie percebe o erro da fórmula dos cientistas. 

Há inclusive passagens do texto que ilustram bem a que se refere o título, como quando Charlie escreve que nos relatos do dia 17 de setembro quando diz que “Coloquei o corpo de Algernon em um pequeno receptáculo de metal e o levei para casa comigo. Eu não ia permitir que o despejassem no incinerador. É tolo e sentimental, mas ontem à noite, bem tarde, eu o enterrei no quintal. Chorei enquanto colocava um monte de flores selvagens sobre o túmulo“. 

Essa é a data de falecimento do seu amigo rato, mas Charlie volta a falar de flores novamente em seu último relato (já contando com erros gramaticais novamente), quando pede “porfavor si você tive uma oportunidadi colo qui umas flores no tumulo du Algernon nu quintau”

Qual o Final de Flores Para Algernon?

Estamos chegando ao final da nossa resenha de Flores Para Algernon pulando alguns acontecimentos importantes. Mas há um que não dá para pular: quando Algernon ataca Charlie, que percebe que o rato deveria voltar ao laboratório e que, devido ao comportamento errático, seu fim estava próprio – e de certa forma, o próprio fim de Charlie. 

O protagonista volta ao laboratório, mas não sem antes convencer a fundação que banca o projeto a deixá-lo também pesquisar formas de evitar a remissão da so seu Q.I. As tentativas não estão bem sucedidas, então Charlie começa a pensar nas alternativas para o caso de voltar a ter que conviver com a baixa capacidade intelectual e inclusive faz visitas ao Instituto Warren – local que abrigava pessoas com condições similares à de Charlie. 

Charlie desvenda o real motivo da operação ter dado errado, logo antes de começar a perder, na mesma velocidade que ganhou, a sua capacidade intelectual. 

Após um breve novo relacionamento com Alice, Charlie despede-se das pessoas do laboratório, volta a trabalhar na padaria (agora “bem quisto” novamente pelos colegas) e prepara a sua mudança para o Lar Warren de onde escreve os seus últimos relatórios. 

Implicitamente, é possível saber que o seu fim está próximo. 

Quem Escreveu Flores Para Algernon?

Flores Para Algernon é escrito pelo autor Daniel Keyes. O início da sua carreira foi como escritor de roteiro para quadrinhos, tendo trabalhado para Stan Lee. Foi desenvolvendo essas histórias que, primeiramente, ele teve a ideia de escrever Flores Para Algernon, mas achou que ela seria melhor em um conto, não nos quadrinhos. 

Assim, em 1960 ele o publica em forma de conto e ganha o prêmio Hugo. Posteriormente, transformou o conto em romance em 1966, ganhando o prêmio Nebula, e catapultando a obra para a fama como conhecemos hoje. 

Além do seu maior sucesso, o autor também conta com outros 7 romances publicados, mas nenhum deles foram traduzidos para português. 

Porquê Ler Flores para Algernon?

Flores Para Algernon é um clássico da literatura norte-americana e um marco da ficção mundial que traz questionamentos perturbadores e duradouros. 

Alguns desses questionamentos são levantados pelo próprio Charlie em seus relatórios de progresso sobre como, quando da sua tomada de consciência sobre o que acontecera no passado, percebera que a sua vida toda passou por pessoas que não o consideravam um indivíduo, o ignoravam, o tratavam com condescendência ou simplesmente o agrediram física ou moralmente. 

Alguns exemplos é o constante bullying sofrido por pessoas portadoras de condições que diminuem as suas capacidades intelectuais, a própria rejeição da família que, muitas vezes, não aceita ou não sabe como lidar com esse tipo de situação. 

Isso o fez levantar o seguinte dilema: ao ver uma pessoa portadora de necessidades especiais físicas, muito provavelmente nenhum indivíduo teria coragem de maltratá-la ou agredi-la, mas quando se tratavam de pessoas portadoras de déficit intelectual eram comuns as agressões, as humilhações e as chacotas – sem nenhum remorso por parte dos agressores.  

Dessa forma, o livro é sim uma leitura bruta e inesquecível que nos faz questionar nossos próprios dogmas. Portanto, não seria possível finalizar essa resenha de Flores Para Algernon sem dar uma nota 5 estrelas ⭐ para essa obra eterna.

Classificação final:

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