Você já parou para pensar em como a vida parece injusta quando o assunto é tempo, dinheiro e disposição? Quando somos jovens, temos todo o tempo do mundo, mas falta dinheiro e maturidade. Na fase adulta, o dinheiro chega, mas o tempo desaparece. Já na velhice, pode sobrar dinheiro, mas a saúde e o tempo de qualidade já ficaram para trás.
Essa reflexão, que já passou pela cabeça de muita gente, é o ponto de partida para a história de O Curioso Caso de Benjamin Button, escrita por F. Scott Fitzgerald.
Sobre o livro: o que é “O Curioso Caso de Benjamin Button”?
O Curioso Caso de Benjamin Button (no original, The Curious Case of Benjamin Button) é um conto publicado pela primeira vez em 1922, como parte da coletânea Tales of the Jazz Age. A obra tem apenas cerca de 176 páginas e apresenta uma ideia tão original que, décadas depois, acabou inspirando o famoso filme de 2008 estrelado por Brad Pitt e Cate Blanchett.
A história acompanha Benjamin Button, um homem que nasce velho e vai rejuvenescendo ao longo da vida. Literalmente: ele nasce com aparência de um idoso, com rugas e cabelos brancos, e ao longo dos anos vai ficando mais jovem, até terminar a vida como um bebê.
➜ Caso esteja gostando de conhecer nossa resenha de O Curioso Caso de Benjamin Button, também convido para se inscrever nas nossas redes sociais, Canal do Youtube, Instagram e Canal do Telegram, para acompanhar textos como esse em primeira mão.
Trama principal: a vida ao contrário
Desde o nascimento, Benjamin é um “problema” para sua família. Seu pai se recusa a aceitar o filho com aparência de idoso. Já adulto (em termos biológicos, mas adolescente em mentalidade), Benjamin tenta se encaixar na sociedade: vai para a escola, tenta trabalhar, casa-se com uma mulher que, com o passar do tempo, envelhece enquanto ele rejuvenesce.
Um dos momentos mais curiosos da narrativa é quando Benjamin, já com aparência de um homem jovem, é aceito para jogar futebol americano na universidade — uma inversão completa das expectativas da sociedade.
O final é agridoce. Benjamin vai ficando cada vez mais novo até que, já sem consciência do mundo, torna-se um bebê e… desaparece.
A reflexão central: inverter o tempo não resolve a injustiça da vida
O que torna O Curioso Caso de Benjamin Button interessante não é apenas o conceito inusitado de envelhecer ao contrário, mas a constatação de que, mesmo assim, a vida continua injusta.
Benjamin experimenta a vida de trás pra frente, mas ainda assim enfrenta preconceito, solidão e o sentimento de inadequação. Quando deveria viver as fases com plenitude, a sociedade o trata como um estranho. E os conflitos com o tempo continuam: quando tem energia, lhe falta maturidade; quando encontra equilíbrio emocional, sua aparência o trai.
Essa inversão é quase uma metáfora de como todos nós, de alguma forma, nos sentimos deslocados nas fases da vida.
Essa reflexão sobre o desencontro entre tempo e desejo também aparece em outra grande obra de F. Scott Fitzgerald: O Grande Gatsby. Lá, o personagem J. Gatsby tenta de todas as formas reviver o passado e reconquistar um amor perdido, acreditando que dinheiro e status podem fazê-lo controlar o tempo e os sentimentos. Tanto Gatsby quanto Benjamin Button são, cada um à sua maneira, vítimas de uma ilusão sobre o que significa ter controle sobre a própria vida.
Pontos fortes e fracos da obra
O que funciona bem no conto:
- A ideia central é genial, especialmente se pensarmos que foi escrita há mais de 100 anos.
- A narrativa é rápida e direta, o que torna a leitura fácil e acessível.
- A história levanta discussões existenciais profundas de maneira simples.
O que pode decepcionar alguns leitores:
- O desenvolvimento emocional dos personagens é raso. Não há grandes mergulhos psicológicos.
- A escrita tem um tom mais irônico e distante, típico do Fitzgerald, mas que pode afastar quem busca uma história mais emocional.
- Não espere um épico ou um drama arrebatador. É mais uma fábula conceitual.
Minha opinião: vale a leitura?
Se você gosta de histórias com uma boa ideia central e curte narrativas com pitadas de humor ácido e ironia social, O Curioso Caso de Benjamin Button é uma leitura interessante.
Mas se você espera um drama profundo, personagens complexos e uma escrita emocionalmente carregada, talvez fique com a mesma sensação que eu tive: “Ok, foi bom conhecer a história, mas não é inesquecível.”
Minha nota? 3 de 5 estrelas.
Vale pela reflexão e pela originalidade da proposta.
Curiosidade: o filme é bem diferente
Se você só conhece a versão de Hollywood, saiba que o filme de 2008 é uma adaptação bastante livre. A história do cinema acrescenta várias camadas de emoção, romance e tragédia que não estão presentes no conto original. É quase uma nova história, apenas inspirada na ideia central.
O nascimento de um bebê-aberração mancha a reputação de uma família tradicional – e nem o maior dos privilégios sociais é capaz de livrar os Button dessa desonra. Benjamin tinha a pele enrugada, cabelos brancos povoavam sua cabeça, e uma longa barba grisalha corria de seu queixo. Não havia dúvidas: tratava-se de um velho, e um velho que, ao contrário do resto de nós, rejuvenesceu com o passar dos anos. Neste cômico e tocante conto publicado em 1922, F. Scott Fitzgerald já provoca inquietação nos leitores. Mais do que retratar uma família incomum do século XIX, esta história fala da passagem do tempo e de como ela afeta a vida privada.
A famosa reflexão humorística de Sean Morey
Ao longo dos anos, o tema de viver a vida ao contrário também apareceu no mundo do humor. Um exemplo é o texto conhecido como “O Ciclo da Vida ao Contrário”, do comediante americano Sean Morey.
Na versão de Morey, a vida ideal seria assim: começaria pela morte, depois viríamos envelhecendo ao contrário, passando pela aposentadoria, festas, vida universitária, infância e terminando com um glorioso orgasmo dentro do útero.
Essa reflexão cômica circula pela internet há anos, muitas vezes atribuída erroneamente a Woody Allen ou Einstein, mas o crédito correto é de Morey. Embora com tom de piada, ela dialoga com o conceito central do conto de Fitzgerald. Essa piada de Morey ficou tão famosa que muita gente associa imediatamente ao conceito de Benjamin Button, já que o livro (1922) explorou uma ideia similar décadas antes, mas de forma mais literária e menos humorística.
Conclusão: uma metáfora que segue atual
No final das contas, a grande mensagem de O Curioso Caso de Benjamin Button é simples: não importa a direção que o tempo siga, a vida é feita de desencontros.
Quem produz conteúdo genérico sobre o tempo de vida, muitas vezes esquece dessa nuance: que o desconforto com o tempo é universal. A leitura do conto nos lembra disso — e de como o ser humano sempre vai ter a sensação de que está vivendo na fase errada.
Se você gosta de histórias curtas com grandes ideias, vale conferir.
Ficha técnica da edição:
- Título: O Curioso Caso de Benjamin Button
- Autor: F. Scott Fitzgerald
- Editora: Antofágica
- Edição: 1ª (2022)
- Número de páginas: 176