O livro de Maria Stuart escrito por Stefan Zweig ,e publicado em 1935, é uma biografia completa da famosa rainha da Escócia, rival e prima de Elizabeth I da Inglaterra. Esse livro é um relato histórico que conta detalhadamente a vida da rainha católica genuinamente romântica e sua infeliz vida conturbada.
Maria Stuart (1542-1587) filha de Jaime V da Escócia e Marie de Guise, tornou-se rainha com apenas seis dias de idade. Contudo, mesmo com o título importante e uma vida relativamente “fácil” aos olhos de seus súditos apaixonados – ninguém – nem sequer a pequena rainha, imaginava que um caminho trágico e um destino cruel a aguardavam pacientemente.
Sua história foi tão dramática que se tornou meio que um mistério para os estudiosos que procuram entender os enigmas envolvendo a vida desta monarca. Em seu curto período de vida, ela também foi mantida em cativeiro por quase vinte anos por sua prima, a rainha Elizabeth I, da Inglaterra – sem o direito de ver seu único filho, Jaime VI da Escócia, e futuro Jaime I da Inglaterra.
Com apenas 44 anos, foi condenada à morte por traição e executada brutalmente por um carrasco que tinha como único papel decapitá-la. Os relatos de sua morte são violentamente macabros para dizer o mínimo. Infelizmente foi uma morte lenta para um método considerado rápido e indolor na época.
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Os Traços Estéticos de Maria
Um ponto importantíssimo ressaltado neste livro de Maria Stuart é a beleza extraordinária da protagonista da história, que por todo lugar era extremamente elogiada. Essa beleza era tamanha que compositores e artistas a enalteciam frequentemente em suas músicas, poemas e baladas medievais. Stefan Zweig por sua vez, coloca o leitor em constante dúvida sobre essa beleza, que na época era considerada incrível.
O interessante é que Maria possuía traços estéticos muito apreciados na renascença européia, tais como uma pele leitosa e lábios muito pequenos. Isso a diferenciava de sua rival que fora acometida por uma terrível varíola que deixou marcas em sua pele após sua recuperação e que deixava bem claro pelo que havia passado. Este fora o grande motivo que fez Elizabeth I passar a usar maquiagens com aparências antinaturais e completamente tóxicas (resultando no prolongado envenenamento que matava a rainha da Inglaterra aos poucos).
Entretanto, esse livro não destaca a vida de Elizabeth, mas sim de Maria que possuiu uma vida acompanhada de tragédias do início ao fim.
O Casamento
Com apenas seis anos incompletos de vida, Maria foi obrigada a mudar-se para a França por conta de um tratado de casamento. Lá ela recebeu a educação necessária até casar-se de fato com Francisco II, rei da França, tornando-se sua rainha consorte (não tendo poder algum como governante).
O Retorno à Escócia
Logo Maria retornou ao país de origem porque seu marido faleceu dentro de pouco tempo com uma aterrorizante infecção no ouvido. E só a partir daí que a jovem “Mary” assumiu seu reino definitivamente. Naquela época, sua mãe Marie de Guise, já havia falecido e Maria tinha 18 anos, idade ideal para governar sem a necessidade de um regente.
O fato mais interessante de seu retorno, é a terrível angústia que ela sentiu ao ver o país onde cresceu desaparecendo no horizonte à medida que o navio se afastava ainda mais da costa em direção ao seu país natal. A Escócia que a jovem mal se lembrava.
Uma passagem do texto diz o seguinte e de certa forma é emocionante: “Começou a contemplar, repetindo incessantemente as palavras: ‘Adeus, França; adeus, França! Acho que não vou te rever nunca mais.’” E foi o que de fato aconteceu. Maria Stuart nunca mais viu o tão adorado lar de sua juventude.
Católicos x Protestantes
Este também é uma dos pontos importantes no livro de Maria Stuart. Ao chegar à Escócia, Maria teve a surpresa de encontrar seu país envolvido em um conflito religioso com a Inglaterra. Católicos que apoiavam Maria Stuart contra Protestantes que apoiavam Elizabeth I – justamente porque anteriormente Maria Stuart reivindicou seu direito ao trono inglês depois do falecimento de Maria I da Inglaterra (apelidada como Maria, a sanguinária), em 1558, e foi apoiada veementemente por Henrique II (irmão de Francisco II).
Elizabeth, sendo uma das filhas de Henrique VIII, tinha o total direito de suceder ao trono inglês por lei. Sendo 1558 o ano de sua ascensão ao trono. E, por esse motivo, as disputas religiosas travadas na Inglaterra fizeram com que muitos apoiassem as reivindicações de Maria, a rainha dos escoceses.
Entretanto, seu inevitável desejo pelo poder inglês transformou-se em um grande obstáculo no caminho dessas duas rainhas rivais e nas possíveis relações de paz que poderiam ter tido.
O Novo Casamento
Em 1565, Maria decidiu se casar com Lord Darnley, seu primo, nobre inglês, sendo também um súdito de Elizabeth I, mas com linhagem tradicional escocesa e católica – consequentemente um bom partido para a rainha.
Com a união, nasceu um filho, mas rapidamente o casamento entrou em crise já que seu marido exigia a coroa matrimonial para poder governar ao lado da esposa. Já que como Maria no passado, Darnley também recebeu o título de rei consorte. E, ao seu pedido ser recusado, Darnley completamente ensandecido pelo ciúme, passou a conspirar contra a própria esposa. Com isso, ele, junto de seu grupo protestante, assassinaram o secretário privado da rainha, seu mais fiel amigo.
Após esse acontecimento, Maria conseguiu convencer seu marido a fugirem juntos dos conspiradores para se refugiarem em outro castelo enquanto as coisas se amenizavam. E nesse meio tempo, ela descobriu que o plano original era seu aprisionamento enquanto Darnley era colocado no trono. No entanto, a rainha perdoou os conspiradores e não fez nada contra o marido em um primeiro momento.
Porém, tudo mudou drasticamente por conta de uma paixão. E de um adultério.
O Terceiro Casamento
A história a respeito de seu terceiro marido é muito controversa. Earl Bothwell foi o homem que destruiu tudo que a rainha escocesa tinha. Chamado de lorde ou conde Bothwell, foi a verdadeira chama que acendeu Maria Stuart como nenhum homem antes havia acendido (não vamos entrar em detalhes aqui sobre os motivos que a levaram a se sentir desta maneira, mas esta é uma das partes mais impactantes do livro de Maria Stuart).
E ela sentiu o que nenhum de seus dois maridos a fizeram sentir antes. Ela encontrou alguém “que destruiu todas as suas forças femininas, sua vergonha, seu orgulho, sua segurança, finalmente um que lhe abriu prazerosamente seu próprio mundo vulcânico até então inconsciente”.
A leitura desse capítulo em específico, mostra o quão frágil Maria parece perto de Bothwell. Ele era apenas um homem no qual ela confiava e admirava e de um dia para o outro estava incondicionalmente apaixonada. E detalhe: era um adultério duplo. Bothwell também era casado e “o homem pelo qual ardem todos os seus sentidos nem a ama de verdade. Bothwell a tomou como a muitas outras mulheres”. Ele estava disposto a deixá-la rapidamente quando seus sentimentos esfriassem. O que enlouqueceu a rainha romântica.
Alguns meses se passaram e boatos de que Maria Stuart estaria apaixonada por Earl Bothwell começaram a correr na Corte escocesa, mesmo com o tratamento frio que a rainha oferecia ao seu amante na frente de possíveis testemunhas. Sua relação com o marido tornara-se mais fria do que nunca. E misteriosamente um incêndio duvidoso ocorreu na residência em que o rei consorte estava instalado, falecendo por sufocamento pela fumaça. Rapidamente, a rainha e Bothwell tornaram-se os principais suspeitos do assassinato.
O amor e o desespero de Maria em ser abandonada por Bothwell que amava sua esposa mais do que nunca era tremendo ao ponto de ela lhe oferecer um casamento para prendê-lo a si. E em menos de três meses da morte de seu marido, a rainha se casou seguindo um ritual protestante (outro ponto bastante contraditório e de certa forma irônico, o que ressalta ainda mais sua aflição). Por sua vez, Bothwell tinha se divorciado da “adorada” esposa apenas poucos dias antes do casamento com a rainha. E ,com toda a certeza, o casamento de Maria Stuart com o homem suspeito de ter matado seu marido deixou a nobreza indignada.
A Conspiração
Em pouco tempo, todos os seus apoiadores se viraram contra ela e rapidamente uma nova conspiração surgiu. Em 1567, ela foi forçada a renunciar ao trono escocês em favor de seu filho. E um ano depois ela tentou recuperar o trono em 68, mas fracassou e acabou fugindo de seu país, deixando seu filho com o irmão mais velho. Sua despedida final com Bothwell é um abraço, mas nenhum dos dois sequer sabiam que seria a última vez que se veriam e que suas mortes seriam tão distintas quanto suas vidas.
Algum tempo depois, ela pediu abrigo para Elizabeth, pensando inocentemente que sua rainha prima poderia lhe ajudar a recuperar o trono perdido. Elizabeth, a princípio, aceitou abrigá-la de bom grado, mas foi influenciada a deixá-la como uma prisioneira. Durante 19 anos, Maria Stuart viveu trancada com os luxos eventuais da nobreza, porém completamente isolada e afastada de seu país.
A Execução de Maria
Sua condenação se deu por conta de uma conspiração que envolvia o assassinato da rainha Elizabeth I. E, como citado anteriormente, sua morte foi dolorosa e violenta por conta dos erros que o carrasco cometeu ao manusear a lâmina da decapitação.
Um relato interessante é que Maria Stuart se vestiu completamente de vermelho no dia de sua execução justamente para que a cor de seu sangue não se destacasse muito ao redor dela. Porém, uma cena um tanto emocionante, é a de antes de sua execução, onde Maria reza a oração católica enquanto todos os outros presentes a desrespeitam rezando a oração protestante.
Muitas outras curiosidades acercam a execução da rainha escocesa. Ela usava uma peruca que só foi descoberta após a decapitação (em seus últimos anos de vida, o cabelo de Maria ficou curto). Além de descobrirem um cachorro embaixo das saias do vestido da rainha morta. Um dos bichinhos de estimação que não gostaria de se afastar de sua dona já sem vida. Ao retirarem-no de perto dela, ele ganiu desesperadamente, já parecendo entender tudo o que acontecia ao seu redor.
Seu último desejo era de ser enterrada em solo francês (um lugar que ela realmente amou), mas esse desejo não foi concedido. Ela foi inicialmente sepultada na Catedral de Peterborough, sendo transferida em 1612, por seu filho, para Abadia de Westminster, onde ironicamente Elizabeth I descansa até hoje. Até na morte as duas permanecem unidas.
No entanto, seu desejo de unificação da Escócia com a Inglaterra ocorreu alguns anos após a sua morte, quando seu filho foi coroado como rei da Inglaterra em 1603 já que Elizabeth nunca teve filhos.
O Autor: Stefan Zweig
Desde os acontecimentos verdadeiros, inúmeros livros, romances, peças de teatro, filmes e séries de televisão já foram feitos sobre Maria Stuart, apresentando-a com diversas faces, sendo já uma política intrigante, assassina, mártir, categoricamente voluptuosa, e até mesmo como uma verdadeira santa. Stefan Zweig, diferente de outros autores, procura se aproximar e se aprofundar mais na figura de mulher da rainha escocesa, que por sua vez, é generosamente antagônica nos momentos mais importantes de sua vida e no sombrio dia de sua morte.
Zweig acertou em cheio ao conseguir iluminar a figura da rainha dos escoceses, traçando um perfil psicológico completo e uma linha do tempo precisa que transformou sua biografia em um thriller incrivelmente detalhado, que apresenta uma Maria forte e determinada para sua época. Principalmente ao se considerar as condições instáveis que perseguiam sua pessoa e seu reino. Maria Stuart cria seu próprio destino, mas acaba tendo um fim triste em decorrência de suas significativas escolhas.
Um pouco sobre o autor: Stefan Zweig foi um escritor austríaco e doutor em filosofia pela Universidade de Viena. Ele dedicou boa parte de suas obras em biografias de figuras históricas e expressivas da arte e da filosofia. Zweig e sua segunda esposa, Lotte, se suicidaram juntos em 1942, durante seu exílio no Brasil, em Petrópolis (Rio de Janeiro), onde moravam. O motivo? O descontentamento e a depressão que sentiam em relação ao desenrolar da guerra na Europa e o avanço desenfreado do nazismo.
Conclusão da Resenha do Livro de Maria Stuart
Concluímos que é uma leitura bastante interessante e ótima para adquirir conhecimentos inteiramente novos. Além de curiosidades marcantes que contribuíram para o desenvolvimento das duas monarcas rivais que eram tão distintas entre si. Agora percebo, ao fim desta resenha, que algumas das adaptações mais famosas feitas por cima dessa história não são tão reais quanto a descrição fiel que Stefan Zweig fez a este livro.
Além das incontáveis pesquisas que provavelmente foram feitas até chegar ao resultado final. A realidade da dor e do sofrimento que Maria Stuart sofreu no decorrer de sua vida realmente é algo que toca o leitor. E em retrospectiva, é fácil sentenciar as escolhas certas que ela deveria ter tomado se quiséssemos que tivesse um final diferente do que de fato aconteceu.
O livro de Maria Stuart não é mais uma tentativa de buscar a verdade na história, apesar de parecer a mais real. Já que nada mais se pode comprovar. Zweig destaca: “na história de uma existência, só importam os momentos de vida intensa, decisivos; por isso ela só é narrada com exatidão quando vista neles e deles. Somente quando um ente humano põe em jogo todas as suas forças, está realmente vivo para si e para os outros; somente quando dentro dele a alma arde, é que se exterioriza sua personalidade”.
Será que as coisas seriam diferentes se ela tivesse sido um pouco mais rigorosa em suas decisões? Será que as coisas seriam de fato diferentes se ela não tivesse levado tudo para o lado mais fácil e lutasse duro e com determinação para vencer os desafios que sem dúvida se colocaram na frente dela? Será que ao ter se recusado em cair nas graças de sua prima, ela só não piorou sua própria situação, o que certamente a levou até onde chegou?
Sem dúvida, nunca saberemos as respostas, pois às vezes é muito difícil tomar as decisões corretas, já que nunca sabemos quais consequências virão com elas afinal de contas. Creio que a rainha escocesa apenas tomou as escolhas que pensava ser as melhores para si e sua nação, o que na realidade não era. O que não posso negar, é que sinceramente, a vida da rainha Stuart me intrigou e me prendeu do início ao fim.
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